O Sofista - Platão

“A linguagem contra Parmênides” – este será o centro da discussão que só será resolvido na quebra de um paradigma para a aceitação de outro, isto é, O Sofista é o livro do parricídio de Platão contra seu pai intelectual, que é Parmênides, substituindo-o pela linguagem como o novo paradigma.

         Assim, particularmente para a nossa Bibliotheca, é sensacional que a linguagem se apresente como aquela que insiste com o óbvio colocando-se contra as conclusões da lógica filosófica e, ao mesmo tempo, é aquela que irá fornecer a solução para as aporias que ela mesma instiga nos filósofos. Sensacional é ver o Estrangeiro e Teeteto recorrerem à gramática, mais especificadamente, às letras, que são símbolos, e ao discurso (nome mais verbo), para solucionar as grandes contradições nas quais se encontram mergulhados.        

Se lermos O Sofista logo após Parmênides, duas características devem nos saltar aos olhos imediatamente: primeiro, os dois livros seguem uma mesma lógica argumentativa e, segundo, acredito que posso dizer que o problema comum que justifica os dois livros é o mesmo: a linguagem.

         A lógica argumentativa é que, em Parmênides, o “Uno” e o “Múltiplo” se entrelaçam, misturam-se, imbricam-se, esta é a tese. Em O Sofista, é a vez de aplicar isso ao “Ser” e ao “Não-Ser” e mostrar que, semelhantemente, os dois se unem, os dois são possíveis, os dois não são contraditórios. E o que justifica a ambos os livros, o que motiva ambos os diálogos é a constatação – e este é o interesse para nossa Bibliotheca – que, na verdade, embora a lógica usada pelos debatedores possa muitas vezes ir numa direção, a linguagem é a grande responsável por fazê-los ter que enfrentar os fatos de que suas conclusões são insustentáveis.

         Tanto no Parmênides como no O Sofista, a linguagem permite fazer o que a lógica de suas argumentações diz ser impossível. De modo mais específico, em O Sofista, é impossível falar sobre o Não-Ser, pois falar sobre ele seria trazê-lo à existência e isso é uma contradição. Assim, é a própria linguagem que força a buscar uma conclusão diferente, uma via diversa, como podemos lembrar, por exemplo, de Górgias (ver Crátilo), para quem falar do “Não-Ser” era não falar, apenas emitir sons e ruídos. Ora, nada mais “fictício” do que isso, pois é a linguagem que nos permite nomear coisas inexistentes ou dizer falsidades e tudo isso é significativo.

         Duas perspectivas podem ser levadas em conta sobre as discussões em O Sofista. Primeira, tudo o que se discute não leva em conta a existência de um Legislador Moral, isto é, não há a figura de um Deus Moral, que ainda será trazido pelo Cristianismo, como referência, justificativa e fundamento para todas as coisas (ainda que, neste livro, haja o argumento do Criador que é a razão por trás de todas as coisas). Segunda, é que, como teólogos cristãos, é assombroso - e esta é a única palavra que me ocorre - é assombroso que, 4 ou 5 séculos antes de Cristo, as discussões filosóficas tenham chegado ao ponto que chegaram. Muito mais do que simplesmente desatar o nó do Ser e do Não-Ser, enfrentar o tema melindroso do Movimento e do Estático, discernir entre o Uno e o Múltiplo na natureza do Ser que é (e que não é - problema fundamental da predicação), para muito além disso, só posso aceitar que o próprio Deus já estava preparando a humanidade para a compreensão dEle mesmo, quando, em Jesus, a Plenitude da Divindade Trina e Una fosse totalmente revelada. É assombroso reconhecer que a Plenitude dos tempos (Gálatas 4:4) não foi apenas uma convergência histórica, econômica, política, mas, principalmente, a Plenitude dos tempos para a chegada de Jesus foi uma convergência filosófica e intelectual, que daria condições ao Cristianismo de revelar aos homens toda a sua assombrosa envergadura espiritual em discurso dialético sobre o Ser de Deus.

         Com a próxima resenha, O Timeu, pretendo encerrar essa digressão necessária no corpus platônico quanto ao recorte que nos interessa. Acredito que estes 4 diálogos (Crátilo, Parmênides, O Sofista e O Timeu) dão uma base sobre o tema da linguagem, que é o fundamento de nossa teoria dos símbolos, e permitirá que nos debrucemos em outros livros até que, novamente, sejamos trazidos de volta aos gregos.

           Para acessar a resenha completa da obra, clique aquiO blog "Bibliotheca de Semiótica" pretende ser um banco de resenhas para interessados e missionários que trabalham com outras culturas. Assim, é característica da "Bibliotheca" que, durante os resumos dos livros, eu faça comentários sobre as ideias do autor, concordando ou refutando, para que o leitor possa encontrar uma crítica e auxílio para a formação do seu próprio pensamento. Boa leitura!  

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Após a leitura, classificarei os livros assim:
Péssimo [0] Ruim [*] Regular [**] Bom [***] Muito Bom [****] Excelente [*****]